Introdução ao design de superfícies

Na coluna deste mês, Nathaly Domiciano fala sobre o design de superfícies e entrevista a designer e consultora Renata Rubim, que trouxe o conceito ao Brasil

 

A expressão “Surface Design” (Design de Superfícies) surge na década de 70 com a SDA (Surface Design Association, nos EUA) destinada ao segmento têxtil. A expressão e esse segmento do design foram introduzidos no Brasil através da designer e consultora de cores Renata Rubim, na década de 1980. O setor segue em ascensão e se expressa nas mais variadas áreas como: Artes Plásticas, Arquitetura, Design de Moda, Interiores, Produto, Gráfico, Comunicação, Semiótica, entre outras. 

 

Renata Rubim foi a pessoa que, mesmo à distância, me trouxe toda inspiração e referência sobre esse segmento que hoje é uma das minhas especialidades. Foi baseada em todos os estudos, coleções e processos criativos que pude conhecer ainda mais sobre essa área do Design que traz não somente um conceito ou uma plasticidade, mas sim uma emoção, uma história e um significado para contextos e demandas da sociedade. 

 

Tapete Neutros – Coleção Conceito Múltiplos, por Renata Rubim explorando a percepção tátil em uma linha de tapetes geométricos. Acervo pessoal da profissional

 

Após 4 anos dedicados a essa área, posso definir que o Design de Superfícies é a atividade criativa e sensorial caracterizada por desenvolver qualidades e soluções plásticas, funcionais, sensoriais e mecânicas para superfícies planas e volumétricas, de modo a envelopar e recobrir os espaços por meio de pigmentos, texturas, técnicas, grafismos e processos, além de criar identidades para as mais variadas culturas e contextos.

 

Renata Rubim é a profissional que difundiu todo o seu conhecimento para inspirar novos profissionais a desenvolverem produtos e coleções no segmento da Arquitetura e do Design, concentrando-se principalmente em soluções estéticas, funcionais e sensoriais, afinal as superfícies estão concentradas em todo o espaço: móveis, decoração, adornos, iluminação e os revestimentos – cada um deles possui sua própria cartela de cores, seu acabamento, uma textura que os identifique e um formato que traga identidade e personalidade. Entre tapetes, azulejos, ladrilhos, cerâmicas, cobogós, tecidos, papéis de parede, o design de superfícies é a ferramenta que conecta conceito e partido em uma linguagem múltipla que transforma os espaços e gera significados.

 

Cobogó Atoll com o prêmio IF Design Awards 2014. Renata Rubim assina para Solarium Revestimentos. Acervo pessoal da profissional

 

Revestimento tridimensional Illusione que cria diferentes efeitos de luz e sombra, além das possibilidades versáteis de paginações. Renata Rubim assina para Solarium Revestimentos

 

Dessa forma, para introduzir o tema de Design de Superfícies, nada melhor do que entrevistar a profissional que trouxe todas as singularidades desse segmento. Aqui nós falamos sobre a denominação do Design de Superfícies, principais aplicações, quais áreas já atuou e principalmente as contribuições desse ramo para todos os segmentos do Design e também da Arquitetura.

 

  1. Como foi trazer o conceito do Design de Superfícies ao Brasil?

“Foi natural, assim que fui apresentada ao conceito pensei que tinha que espalhar para o máximo de pessoas. Nos primeiros anos após a minha volta dos EUA ouvia críticas de professores de escolas de design e alguns designers, que achavam que se resumia a tratamentos superficiais e ‘soluções cosméticas’ dos produtos.”

 

  1. Atualmente, qual a melhor denominação que você sugere ao Design de Superfícies?

“Design de superfícies é o guarda-chuva de outras especialidades como o design têxtil, o design de papéis, design de azulejos, superfícies cerâmicas, etc.”


Tapete Luzes da Cidade, pontuado por sinuosas linhas que criam uma estampa sutil e delicada. Renata Rubim assina para Tapetah

 

  1. Na área da Arquitetura, Design e Decoração, quais são as maiores aplicações?

“Certamente pisos e paredes (e painéis). Normalmente os meus projetos são industriais, portanto o produto final será apresentado em módulos que serão aplicados e paginados por um arquiteto, provavelmente. No caso de alguém me contratar para uma grande superfície, aí não será design industrial, e sim autoral, customizado, quando vou poder recorrer a vários recursos, como usar diferentes materiais compondo entre si.

Se você pensar nas obras do Burle-Marx você terá um exemplo do que estou me referindo. Os jardins dele eram grande áreas onde ele usava diferentes materiais, e diferentes plantas, claro, inclusive azulejos (uma das minhas paixões).

Isso me faz lembrar um projeto de uma praça que projetei o ano passado para uma área de circulação da Santa Casa de Porto Alegre que deverá ficar pronta em um ou dois anos. A praça é num plano só, portanto vista de cima, é uma superfície. O que eu fiz: pensei num grande desenho e o preenchi com diferentes elementos, meus produtos, cacos de azulejos e também plantas e grama.”

 

Sobreposição e composição de revestimentos que criam um mosaico de superfícies distintas, estimulando a percepção visual e tátil no projeto da profissional. Acervo pessoal de Renata Rubim

 

  1. Quais os benefícios de trabalhar no segmento do Design de Superfícies e o que você considera fundamental estudar para atuar nesse segmento?

“Primeiro a pessoa tem de ser apaixonada pelo DS. Benefícios? Trazer valor a mais ao produto ou à superfície. Cada nicho de mercado tem a sua demanda e o designer deve atender a isso.”

 

  1. Como começaram as primeiras coleções assinadas?

“Eu não trabalho só com coleções, faço muito projeto isolado também. E muita coisa sem assinar (sem ter a marca do meu escritório) porque sempre, desde o início, meu maior objetivo é tornar o meu trabalho acessível também aos segmentos mais carentes da nossa população. Para mim, design tem de ser inteligente para ser eficaz e bem resolvido. Quando o cliente quer identificar sua produção com o meu “selo”, está bem para mim, mas não é prioridade.”

 

  1. Como você busca conciliar as qualidades estéticas de um produto à sua função e, posteriormente, sensação?

“Outra função de um designer é resolver problemas, portanto conciliar estética e função é um grande exercício intelectual e de visualização. Desafios são estímulos ao designer. Resolvemos se mantivermos a mente aberta e ter curiosidade constante.”

 

  1. Qual a importância e contribuição que o trabalho com superfícies traz para o design nacional e internacional?

“Quando acrescenta valor ao produto ou à superfície está contribuindo. O design de superfície no Brasil foi muito aceito na moda e também tem aumentado no mobiliário. No caso da moda o correto é chamar de design têxtil. Acho que como sempre foi o setor que mais copiou do exterior, ainda há muita cópia. Mas existem as exceções que tem muita qualidade e onde há muita pesquisa de materiais e de conceito. Temos bons exemplos na Bahia, em MG e em SP.

 

No caso dos móveis normalmente quem decide atuar com superfície é quem tem mais interesse num projeto com conceito e portanto, alguém que não segue moda, mas sim quem trabalha de uma maneira mais autoral. Aí entram as diferenças de culturas. Num mundo globalizado não tem como evitar influências, o que não significa cópia.”

 

  1. Como você analisa o Design de Superfícies futuramente e quais tendências e comportamentos poderão se consolidar?

Sobre comportamentos, vejo que teremos de ser cada vez mais simples e menos consumistas, então aí a inteligência de resolver mais com menos. No âmbito do design de superfícies, houve um crescimento com as novas tecnologias e isso deve continuar… Desde pequena, sempre quis projetar calçadas e no início da década de 90 consegui realizar meu sonho. A calçada foi na frente de um badalado café numa rua considerada o point de Porto Alegre e minha referência foram 2 coisas: o logotipo do Café e usar pedras portuguesas que eu considero um patrimônio cultural do Brasil. Aliás, deveríamos nos dar conta e valorizar cada vez mais a herança recebida dos portugueses nos azulejos. Felizmente está acontecendo um revival do uso dos azulejos que tanto eram apreciados pelos arquitetos nas décadas de 40, 50 e 60. É outro sonho que realizei há um ano criando coleções para a empresa carioca Vizta Design Assinado.”

 

Composição em azulejos da marca Vizta. Acervo pessoal da profissional

 

  1. Que sugestão você daria para estudantes e profissionais que queiram iniciar nessa área de atuação?

“Pesquisar a área, procurar aprender sobre profissionais e seus trabalhos, tentar fazer estágios (com a pandemia isso fica difícil), ter uma rede de contatos em crescimento.”

 

  1. Uma coleção em especial:

 

“Todos gostam da coleção Brasiliana assinada para Oca Brasil: Para contemplar os 500 anos de Brasil, o projeto trabalhou três situações distintas: o povo nativo, os indígenas (Tribal), a colonização portuguesa (Colonial) e o Movimento Modernista, século 20 (Modernismo). Esse último tem como inspiração principal a obra de Burle Marx.”

 

Revestimento linha Tribal, assinado para Oca Brasil

 

 

Composição de estampas orgânicas e geométricas que criam uma referência direta aos azulejos portugueses, aplicados em novas superfícies, na linha Colonial

 

 

O movimento modernista guia a terceira linha da coleção Brasiliana. Inspirada em Burle Marx, as estampas são abstratas, com fortes traços do concretismo e do construtivismo, formas que mudaram o jeito de o mundo ver as artes plásticas (O próprio logotipo do escritório da designer Renata Rubim também serviu de referência).

 

Estampas sólidas que se combinam ao orgânico e geométrico, na coleção Modernismo da Oca Brasil

 

E você? Encantado pela área de Design de Superfícies? Acompanhe e se inspire porque todos os meses continuo apresentando um pouco mais desse trabalho em duas diferentes vertentes e ramificações. E é claro, não deixem de acompanhar o trabalho impecável da querida designer Renata Rubim

 

*** Nathaly Domiciano é designer e especialista em design de superfícies, coolhunting, biofilia e design multissensorial

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