A psicologia do design

Como efetivamente aplicar o conhecimento da área da psicologia no momento de projeto e criação no design de interiores

 

Por Fernanda Olinto*, colunista

 

Agora que já abordamos a relação pessoa e ambiente e já elucidamos o envolvimento da psicologia com o design, hoje trago um exemplo de aplicação prática, uma metodologia específica para esta temática de psicologia do design. Isto é, como efetivamente aplicar o conhecimento da área da psicologia no momento de projeto e criação da área do design de interiores. Inclusive utilizando o método de biografia ambiental que trouxemos como tópico da última coluna.

Para isso, utilizaremos como referência as criadoras do termo e do processo, chamadas Susan Painter, Constance Forrest e Toby Israel. Psicólogas e designers de interiores que unem suas ideias para, quem sabe um dia, sentarmos em uma sessão de terapia para decorarmos nossa nova casa. Pois é mais ou menos assim que elas uniram ferramentas da psicologia para adentrar nos gostos e preferências de seus clientes e também em suas moradas.

 

Partindo do princípio de que é pertinente conectar design e psicologia por meio do insight de que relacionamentos entre pessoas e lugares são tão emocionais quanto o relacionamento entre duas pessoas, as fundadoras insistem que a contribuição mais incrível que a psicologia do design traz é que ela reconhece a crítica influência das emoções na resposta e relacionamento dos indivíduos com os espaços. Isto faz uma ponte de especulação com o fato de que o nosso sistema de reconhecimento visual-espacial é localizado no lado direito do sistema límbico do cérebro, este que lida também com respostas emocionais e relacionamentos.

 

As principais técnicas para o profissional destas duas áreas aplicar em seus clientes e adentrar este mundo são bastante interessantes. Conversas são fundamentais para qualquer início de projeto, questionários também quando possível, porém o que elas abordam de diferente em seus diálogos e visitas tem efetivamente mais a ver com o tempo de envolvimento entre profissional e cliente. É o desprendimento de tempo por ambas as partes, uma profunda relação com o processo, antes de iniciar o projeto em si.

 

Inicialmente é imprescindível visitar a moradia atual do cliente, ver com seus próprios olhos como é o espaço o qual o indivíduo já vive -o qual ele vai deixar ou quer modificar. Nessa peculiar visita, não se faz apenas um levantamento métrico ou fotográfico, e sim uma sessão de conversa e técnicas. Pede-se que o cliente inicie um desenho em um papel, que expresse como sua casa é vista no momento presente e como também o indivíduo se vê nela. Neste momento pode-se expressar com cores, palavras e muita liberdade de criação. Na sequência, é preciso explicar o porquê do desenho final e seus detalhes, em um diálogo entre morador e casa. Em seguida, pede-se para inverter os papéis, e a casa do desenho deve falar com você, por meio de você.

 

Muitos sentimentos surgem, e a profundidade dos resultados do processo é surpreendente, segundo as autoras e os relatos trazidos. Neste momento conclui-se a visita com mais de clareza sobre as alegrias e as dores da casa presente, e as necessidades e as vontades para a casa futura.

 

Durante o processo, utiliza-se a biografia ambiental para entender e conferir a coerência entre o que o cliente expressou durante a sessão e o que seu histórico conta. É possível então fazer um link entre as ferramentas utilizadas e descobrir os elementos do passado que afetam o presente.

 

 

Ao mesmo tempo da biografia ambiental, desenvolve-se um histórico de momentos bons e ruins. É solicitado que seja feita uma escolha da melhor lembrança de sua vida e da pior lembrança. A partir destas recordações, é fundamental uma descrição detalhada de onde se estava no momento de cada uma delas. E a memória não falha, devemos tentar recriar aqueles espaços de bons momentos e afastar aqueles que trazem lembranças ruins. Junto à esta técnica, também é solicitado que se escolha diretamente o lugar em que se sentiu melhor. Pode ser um destino de viagem, ao redor do mundo e, a partir disto, descrever todas as especificidades deste local. Envolvendo todos os sentidos, desde cheiro, sons, tato, além dos aspectos físicos.

 

Uma última ferramenta demanda a escolha dos cinco objetos mais amados. Nesta técnica, deve-se decidir entre cinco itens já existentes em sua casa, definidos em ordem de prioridade. Muito além do objeto em si, se torna visível o que realmente importa, em termos de bagagem pessoal, materialidade, texturas, formas, tecnologia, entre outros.

 

O resultado deste processo da metodologia da psicologia do design é chamado de retrato sensorial. Ele é pessoal e pode mudar ao longo dos anos, mas permitirá projetar com mais propriedade e cuidado para o momento. Ele almeja recriar os aspectos positivos avaliados, reconstruir o senso de segurança e carinho entre morador e moradia, e prioriza uma relação de serenidade e alegria para os projetos.

 

É um longo processo, que exige paciência para descobrir o porquê da busca pela mudança, e entre decidir o que levar para frente e o que é necessário deixar para trás. Em uma busca por harmonia em casa e coerência com o período de vida de cada um.

 

Pois a casa tem esse poder, ela pode proteger, curar, restaurar. Ela pode sanar necessidades e alavancar a liberdade de expressão. É um recanto para memórias e um refúgio do mundo externo. Ela deve nos dar segurança e acolhimento, deve trazer paz e conforto. Deve expressar quem somos agora e no futuro. Isso é casa, é simbólica e é real.

 

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*Fernanda Olinto é designer de produto e de interiores e mestre em Arquitetura e Urbanismo


Fontes:

*GALLAGHER, Winifred. House Thinking: A room-by-room look at how we live. HarperCollins: New York, 2006.

ISRAEL, Toby. Some Place Like Home: Using design psychology to create ideal places. Design Psychology Press: Hove, 2021.

 

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